ITCMD: Imposto sobre Herança e Doação - O Que é, Como Calcular e Estratégias para Reduzir a Carga Tributária
Rodrigo Mallmann
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos, conhecido pela sigla ITCMD, é um tributo estadual que incide sobre a transmissão gratuita de bens ou direitos, seja em razão do falecimento de uma pessoa (herança) ou em razão de uma liberalidade (doação). Sua regulamentação é feita pelos estados e pelo Distrito Federal, de acordo com as diretrizes gerais estabelecidas pela Constituição Federal e pelas leis complementares federais, mas com ampla margem para cada ente federado determinar suas próprias regras específicas, como alíquotas, base de cálculo e hipóteses de isenção.
A origem do ITCMD está ligada ao princípio de capacidade contributiva: presume-se que quem recebe um patrimônio sem ônus possui aptidão financeira para contribuir com o Estado. Por isso, o imposto é exigido quando ocorre a transferência de patrimônio por morte ou por ato de doação.
O Que é o ITCMD e Quem Deve Pagar?
A responsabilidade pelo pagamento do ITCMD recai sobre o beneficiário da transmissão. Ou seja, quem herda ou recebe uma doação é quem deve recolher o imposto. Em casos de herança, o pagamento é feito pelos herdeiros ou legatários; em doações, é o donatário (quem recebe) que deve recolher o tributo.
A obrigatoriedade do pagamento nasce no momento da efetiva transmissão da propriedade ou do direito. No caso da herança, isso ocorre no inventário — judicial ou extrajudicial —, quando se formaliza a partilha dos bens. Para as doações, o fato gerador acontece no ato da doação, independentemente de haver um contrato ou termo formal.
Importante destacar que, ainda que o contribuinte principal seja o herdeiro ou o donatário, a legislação de alguns estados prevê a possibilidade de o doador ser o responsável pelo recolhimento do imposto em casos específicos, especialmente quando há previsão contratual nesse sentido.
Além disso, existem regras especiais para bens situados em diferentes estados ou no exterior. Se o bem transmitido estiver localizado fora do Brasil, a cobrança do ITCMD depende de regulamentação específica e, em muitos casos, a exigibilidade pode ser questionada judicialmente.
Como Calcular o ITCMD: Alíquotas e Base de Cálculo por Estado
O cálculo do ITCMD envolve dois elementos principais: a base de cálculo e a alíquota aplicável.
A base de cálculo do ITCMD é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos. Em linhas gerais, o valor venal é aquele que o bem teria em condições normais de mercado para fins de venda à vista. Para bens imóveis, por exemplo, o valor venal utilizado pode ser o constante do IPTU (o que, muitas vezes, é inferior ao valor de mercado) ou ser determinado por avaliação oficial feita pelo fisco estadual.
Para veículos, geralmente se utiliza a tabela FIPE como referência. Para ações, quotas de empresas, participações societárias e outros direitos, são estabelecidas metodologias específicas conforme o tipo de ativo.
Cada estado tem autonomia para definir critérios de avaliação e atualização da base de cálculo. Alguns permitem a impugnação do valor atribuído, caso o contribuinte discorde da avaliação realizada.
As alíquotas do ITCMD também variam de acordo com a legislação de cada estado. Em geral, as alíquotas vão de 2% a 8%, sendo este último o limite estabelecido pela Resolução nº 9/1992 do Senado Federal. Alguns estados adotam alíquotas progressivas, de acordo com o valor transmitido, enquanto outros utilizam alíquotas fixas.
Veja exemplos:
- São Paulo: alíquota fixa de 4%, mas com proposta de progressividade em tramitação;
- Rio de Janeiro: alíquotas progressivas de 4% a 8%;
- Minas Gerais: alíquota fixa de 5%;
- Santa Catarina: 1% para doações e 3% para heranças;
- Distrito Federal: alíquotas de 4% a 6%, progressivas.
O cálculo, portanto, é feito da seguinte forma:
Valor do bem transmitido (base de cálculo) x Alíquota ITCMD = Valor do ITCMD devido
Exemplo prático: imagine uma herança de um imóvel avaliado em R$ 500.000,00 no estado de São Paulo. Aplicando a alíquota de 4%, o ITCMD devido seria de R$ 20.000,00.
Isenções e Benefícios Fiscais: Quem Tem Direito e Como Solicitar?
Apesar da ampla exigência do ITCMD, as legislações estaduais preveem hipóteses de isenção e não incidência, que, se corretamente observadas, podem gerar significativa economia tributária.
As principais hipóteses de isenção envolvem:
- Transmissão de bens de pequeno valor: alguns estados, como São Paulo, isentam heranças e doações de até R$ 69.025,53 (valor para 2024);
- Doações para entidades sem fins lucrativos: fundações, associações e organizações beneficentes podem ter direito à isenção;
- Doação de órgãos públicos para particulares: em certas hipóteses, como regularização fundiária;
- Hereditariedade de bem único: alguns estados oferecem isenção parcial ou total para casos de único imóvel residencial herdado.
Para obter o benefício, é necessário fazer a solicitação expressa junto à Secretaria da Fazenda ou Receita Estadual, apresentando toda a documentação exigida. A concessão da isenção depende da análise de requisitos específicos, como a apresentação de certidões, laudos de avaliação e documentos comprobatórios.
A legislação de cada estado deve ser cuidadosamente observada. O não requerimento no momento oportuno pode gerar a perda do benefício e a obrigação de recolher o imposto com multa e juros.
Planejamento Sucessório e ITCMD: Estratégias para Reduzir o Imposto Legalmente
O planejamento sucessório é uma ferramenta fundamental para quem deseja organizar a transmissão de patrimônio, assegurando a continuidade dos negócios familiares e reduzindo a carga tributária do ITCMD de forma lícita.
Existem diversas estratégias possíveis, sendo as principais:
1. Doações em vida
Realizar doações em vida pode ser uma estratégia inteligente. A transmissão de bens via doação permite o fracionamento da transferência ao longo dos anos, aproveitando isenções ou bases de cálculo menores em cada operação.
Por exemplo, ao doar parte do patrimônio gradativamente, é possível ficar abaixo dos limites de isenção de ITCMD em determinadas transferências ou reduzir o impacto da progressividade da alíquota em estados que adotam essa sistemática.
Contudo, é importante lembrar que as doações também geram incidência do ITCMD, e o planejamento deve considerar as implicações futuras, como o pacto antenupcial dos herdeiros e eventual regime de bens.
2. Constituição de Holding Familiar
A criação de uma holding patrimonial é uma prática cada vez mais comum. Nesse modelo, os bens são transferidos para uma pessoa jurídica, que passa a ser titular dos imóveis, aplicações financeiras ou participações societárias. Em seguida, as quotas da empresa são organizadas entre os futuros herdeiros.
A vantagem é múltipla: facilita a gestão dos bens, protege o patrimônio familiar contra litígios e permite uma sucessão planejada e muitas vezes com custos tributários reduzidos. Em muitos estados, a transmissão de quotas empresariais é menos onerosa do que a transmissão direta dos bens.
Além disso, por meio de cláusulas específicas (como usufruto, incomunicabilidade, inalienabilidade e reversão), os doadores podem manter o controle dos bens durante sua vida.
3. Seguro de Vida como Ferramenta Sucessória
Contratar um seguro de vida destinado aos herdeiros pode ser uma solução prática para gerar liquidez imediata no inventário, sem a necessidade de vender bens para pagar o ITCMD e demais custas processuais.
Importante: a indenização do seguro de vida não integra o inventário, não sendo, em regra, tributada pelo ITCMD. Esse aspecto deve ser cuidadosamente analisado em cada caso concreto.
4. Avaliação Estratégica do Local de Residência e dos Bens
Dada a variação de alíquotas entre estados, alguns contribuintes optam por reorganizar seu domicílio ou registrar bens em estados com tributação mais favorável, desde que de forma lícita e efetiva.
É fundamental que a mudança seja real e comprovada, sob pena de ser desconsiderada pelo fisco como fraude.
5. Utilização de Testamentos e Cláusulas Especiais
A elaboração de testamentos pode ajudar a modular a distribuição do patrimônio, garantindo que bens de menor valor ou que estejam sujeitos a menores alíquotas sejam transmitidos estrategicamente.
Cláusulas especiais também podem ser usadas para proteger o patrimônio, limitando sua alienação, comunicabilidade ou sujeição a dívidas.
Conclusão
O ITCMD, embora muitas vezes relegado a segundo plano no planejamento patrimonial, tem impacto significativo no patrimônio transmitido entre gerações.
Compreender sua lógica, conhecer as alíquotas aplicáveis, dominar a base de cálculo e explorar as estratégias legais de planejamento sucessório são etapas fundamentais para quem deseja proteger seu legado e seus herdeiros.
Ignorar a incidência do ITCMD ou não se planejar adequadamente pode significar não apenas custos tributários mais altos, mas também a perda de patrimônio e a criação de conflitos familiares.
A assessoria jurídica especializada é imprescindível para garantir que todas as operações estejam dentro da legislação vigente e que os benefícios fiscais sejam efetivamente aproveitados.
Em um contexto de aumento das alíquotas, crescente fiscalização e valorização patrimonial, o planejamento sucessório deixou de ser apenas uma preocupação para famílias extremamente ricas e tornou-se uma necessidade para qualquer pessoa que queira assegurar o futuro de seus sucessores com eficiência, economia e tranquilidade.



